Tarde demais



 
 

Diferentemente de certas trilogias que estão em moda atualmente, O Senhor dos Anéis me conquistou completamente. Sempre fui apaixonada por histórias fantasiosas - quando muito bem escritas - como a do escritor, professor e filólogo britânico J.R.R. Tolkien.
Foi “deslumbradérrima” pela trama que envolve humanos, anões
, elfos, ents,
hobbits e orcs, que me dirigi ao cinema para a “gran-estréia”da saga, e - com inenarrável decepção - dei com o nariz na bilheteria, pois os ingressos tinham esgotado meia hora antes.
E foi neste dia, enquanto voltava para casa tentando digerir a frustração, controlando-me para, literalmente, não vomitar toda a indignação comigo mesma, que percebi o quanto é dolorido lidar com a própria (responsabilidade?) de encarar o “tarde demais!”.
Perceba o quanto a constatação “tarde demais” é de sua total culpabilidade. Invariavelmente ela reflete toda a negligência que você cometeu a respeito de algo, fazendo arder a sua consciência descuidada.
Meu deslumbre pelo “O Senhor dos Anéis”, deveria ter servido de alerta para o fato de que ninguém, em sã inteligência, deixa para chegar em cima da hora numa grande estreia. Que era algo para ser planejado com esmero, a fim de degustar cada minuto, antes de me extasiar completamente.
Além de ser inesquecível por sua espetaculosidade, O senhor dos Anéis, a partir daquela data, me levou a ser mais precavida com tudo que tenho apreço. Tomo muito cuidado para não dar com a cara na imPLACAcável informação: “Tarde demais!”.
E não me refiro somente às coisas anunciáveis e editáveis como chegar tarde para prova do vestibular, do esperado concurso público ou para comprar o ingresso do show da Madonna.
Falo das tantas vezes que chegamos atrasados para os assuntos prioritários do coração.Para todas as vezes que nos desleixamos com os sentimentos, caímos na farra das emoções passageiras e perdemos a hora de revelar o verdadeiro amor a alguém e - o que é muitíssimo doloroso - não temos mais tempo de usufruí-lo.
E por que marcamos bobeira com as coisas que nos são mais importantes? Por que nos desleixamos, negligenciamos, descuidamos de coisas e pessoas que nos são especiais? Porque só percebemos a real importância que possuem, depois de tê-las perdido. Exatamente quando damos com cara na bilheteria, na porta, no portão ou... num coração... fechado. Quando topamos de frente com o aviso “tarde demais” é que descobrimos o quanto fomos relapsos.
O filho que não revelou ao pai o quanto o amava, em vida. A mãe que só se dá conta de que não viu o filho crescer quando ele já está se casando. O homem que só descobriu que amava a mulher quando ela se apaixonou por outro. A mulher que só descobriu que amava o homem quando ...Ficaria aqui, horas a fio, relatando histórias de pessoas que perderam a hora de viver os sentimentos e amargaram terrivelmente.
Pessoas que subestimaram o poder do tempo e se esqueceram de que ele dita as próprias regras. Pessoas que brincaram – inconsequentemente - com o presente, sem levar em conta que poderiam se machucar –seriamente - no futuro. Pessoas que anseiam desesperadamente poder remediar o passado que pereceu há tempo.
Dos atrasos presumíveis do cotidiano, invariavelmente, teremos uma segunda chance. O Senhor dos Anéis ficou sendo exibido por quase um mês nos cinemas. O vestibular ficou para o próximo semestre. O concurso, para o próximo ano. O show da Madona, quem sabe algum dia.
Já, para reparar o descaso e demonstrar o amor sentido por alguém poderá ser definitivamente e - dolorosamente – tarde demais.
Por isso, fica aqui a minha dica: para chegar num coração, seja pontual!

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