Desafio você a saltar


“Se você me pedisse para saltar de paraquedas de um helicóptero agora, eu o faria”. Proferiu esse pensamento com tamanha emoção que quase pude vê-lo plainando entre as estrelas do céu, naquela noite.
De quem se espera ouvir uma frase como esta? Se não tivesse sido dita a mim, juraria se tratar de um jovem em pleno vigor das faculdades aventureiras ou de alguém no ápice da desilusão existencial, ambos querendo encarar a vida de cima só para cuspir-lhe de coragem e provar que, em alguns momentos, não é ela quem manda.
Mas foi um homem maduro e muito bem sucedido profissionalmente e, aparentemente, de bem com as questões amorosas que confessou isso a mim, um segundo após eu lhe ter perguntado: “Você é feliz?”.
Mas o que lançar-se de paraquedas no colchão negro do céu tem a ver com ser ou não ser feliz?
Também tive este lapso de estranhamento até que, mais rápido do que o girar de pescoço da coruja que nos observava sobre a cerca de madeira, ele esclareceu: “Faria qualquer coisa para ter a sensação de felicidade, pois mesmo tendo tudo para ser feliz, não sou”.
Só quem já passou por uma situação como esta sabe o quanto ela é desconcertante.  Sorte que a noite é habilidosa em dissimular expressões e impressões.  Projetei o meu olhar mais casual sobre a sua face esmorecida e, como todos aqueles que não sabem a resposta a ser dada, eu repeti: “Então, você não é feliz...”. E desta vez ele foi mais rápido do que o mosquito que acabara de picar minha perna sem ser visto: “Não, eu não sou feliz”.
Caramba! Quem mandou eu me intrometer na vida de alguém que acabara de conhecer naquele maravilhoso bar de frente para o mar? Poderia ter lhe perguntado sobre a sua predileção musical, já que ele parecia animado com o repertório executado pelo músico que ali se apresentava. Esta mania de me aprofundar nas almas alheias ainda me enredará seriamente.
Não dá para simplesmente mudar de assunto depois que alguém lhe confessa que não é feliz. Nem propor um brinde para quebrar o gelo: “Viva a vida!”. Muito menos buscar a saída de emergência: “Vamos dançar esta?”.
Ninguém revela a alguém que acabara de conhecer que é infeliz para ter o silêncio como resposta. Ainda mais quando esta pessoa descobre que você é escritora, e que escreve historinhas reais sobre a vida que deveria ser de mentira. Ou seja, o cara estava esperando ansiosamente que eu lhe dissesse alguma coisa!
E o que eu poderia dizer ao senhor infeliz? Que só poderia ser nóia da cabeça dele? Que deveria ser louco por não estar feliz com a sua profissão e, consequentemente, com o seu salário e tudo que ele lhe propiciava? Que naquela altura do campeonato deveria ir para a o camarote da vida e esquecer a besteira de querer experimentar suar na avenida? Que procurasse um psiquiatra e exigisse que ele lhe receita-se “antiefusivos” que lhe eliminasse completamente a vontade de não se acomodar? Que tomasse um Engov e esperasse a embriaguez passar, pois, certamente, seria ela a culpada por todos os desabafos feitos à noite a estranhos? 
Eu teria que nascer de novo, para dizer a alguém barbaridades como estas. E, certamente, sem a inquietante alma de escritora.
 “Bem-vindo ao time dos corajosos!”.  Disse-lhe finalmente.  E no exato momento que em que mirei sua face - agora incrivelmente intumescida - percebi que havia encontrado as palavras certas e que ele havia compreendido exatamente a complexidade do simplismo que ela contém.
Ninguém recebe o rótulo da felicidade colado no bumbum quando nasce junto com as palmadas que o forçam a respirar. Ninguém consegue ser feliz o tempo todo, em tudo. O mundo é feito de dois tipos de gente. O que é infeliz e o que busca ser feliz. Ou, em outras palavras, os acomodados e os corajosos.
E resolvi terminar a conversa com brilhantismo que ela iniciara “Olha, helicóptero e paraquedas a esta hora da noite é complicado, mas a cinquenta metros daqui há uma rampa de parapente. Amanhã, cedinho, com vento ou sem vento, eu desafio você a saltar”.  
E ele respondeu: “Vamos dançar esta?”.



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Tchibum!



Todo mundo possui acontecimentos guardados na caixinha das coisas inesquecíveis da vida. Alguns que adoramos vasculhar, remexer, revisitar. Outros que preferiríamos trancafiar a sete chaves e depois lançar, com caixa e tudo, bem no fundo do oceano. Lista-se aí as decepções, as perdas, os desenganos, os vexames. Do mais baixo ao mais alto grau de gravidade, estes episódios são, ironicamente, os mais desagradáveis e marcantes também.
Lembro até o hoje do tombo que levei durante uma partida de vôlei. Aparentemente, um fato irrelevante na vida de qualquer ser humano, se não tivesse acontecido diante da torcida do colégio em que estudava, na plenitude da adolescência.  Estatelar-me no chão diante do garoto por quem estava apaixonada e das dezenas de candidatas a rival, deveria, realmente, ser algo do tipo que a gente levanta, sacode a poeira e samba em cima. Mas não é.
Tudo indica que aquela cena, que reprisa até hoje em minha memória sempre que, descuidadamente, dou “play” nos meus filminhos terroristas, é a responsável pelo fracasso como possível jogadora de vôlei. Estou me referindo a nunca ter conseguido ser, sequer, uma jogadora amadora de vôlei de praia. Atirava-me no mar sempre que a alguém da galera soltava aquele grito aterrorizante: “Vamos fazer um timinho de vôlei?!” Tchibum! Nestas horas você descobre que é impossível matar os traumas por afogamento.
Citei um fato simples, até hilário, para exemplificar a vulnerabilidade que nos constitui e, antagonicamente, a magnificência que cobramos de nós mesmos e principalmente dos outros.
Não nego que, por certo tempo, acreditei que houvessem pessoas perfeitas. Modelos com garantia de fábrica e selo do Criador.  E não só procurei por elas, como tentei ser igual. Límpida, sem manchas, sem arranhões, sem oscilações. (Recomendo que não tentem repetir isto em casa, nem em lugar nenhum, pois é extremamente perigoso). 
Não sou perfeita! Experimente dizer isto em frente ao espelho e veja o alívio que dá. Não tenho culpa de ser um modelo recondicionado, pelo contrário, assumo as fissuras que me tornam única. Minha digital é formada por muito mais do que meros risquinhos no dedo.
Ninguém é perfeito! Experimente está frase também e tente acreditar nela.  O mundo é feito de gente que tropeçou na hora em que deveria executar o passe primoroso. Gente que não consegue afogar suas próprias reprovações, embora finja que está tudo, fantasticamente, sepultado no cemitério das desilusões.
Não estou propondo a todos que morramos feliz com nossas falhas. Pelo contrário, gostaria de poder excluir a frase “pau que nasce torto morre torto” da lista dos provérbios populares. Considero-a uma ameaça ao aprimoramento humano. Gente que decide morrer torta não tem é vergonha na cara, isto sim. Dá pra melhorar, e muito! Mas não sem abrir a gaveta das fraquezas.
Precisei de muitos mergulhos no mar para descobrir que a saída era entrar naquele retângulo delimitado na areia da praia e tentar acertar a bola sobre a rede mais do que o nariz no chão, ou sentar na cadeira e assistir ao vôlei da galera. Optei pela segunda opção. Um pouco pela preguiça e muito pela covardia mesmo. Há muito, assumi que tenho jeitos covardes de ser. Mas tenho facetas corajosas também. Uma delas é não ter medo de ser quem eu sou.

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A incrível geração de mulheres que ainda acredita no homem do saco



Li, num blog conhecido da internet, um artigo intitulado “ A incrível geração de mulheres que foi criada para ser tudo o que um homem não quer.” E de cara, já nas primeiras linhas do texto, deduzi aonde a autora pretendia chegar e chegou,  muito rapidamente graças a minha leitura dinâmica.
Guerra dos sexos a esta altura da evolução humana? Não tenho paciência. 
Pelo título já dá para sacar que depois de todo blá-blá-blá sobre a mulher ser super isto, super aquilo, super aquilo outro, acaba ficando sozinha porque nenhum homem compreende esta faceta superchata dela ser.
Autoflagelo a esta altura da evolução do planeta? Não tenho saco!
Opiniões estão aí para serem publicadas e respeitadas, mas, pelo amor de Deus, não dá para tomar um estado de vida, e neste caso, certamente, uma vida solitária e mal vivida como uma regra social contemporânea.
Sou neta de uma senhora que mantinha a casa e os negócios próprios com pulso firme e determinação, numa época em que não havia nem televisão colorida.  Dona Francisca era uma empreendedora que fazia pastel e outras guloseimas para vender de porta em porta, sem sequer sonhar que um dia haveria um recurso tecnológico chamado internet, através do qual ela poderia compartilhar seus produtos e vender muito mais. 
Cresci vendo a minha vó paterna correndo prá lá e prá cá. Nem por isso ela deixou de ser a avó dos contos de criança. Trabalhava fora de casa, lavava, passava, cozinhava e ainda tinha tempo e o cuidado de armazenar chocolates na gaveta da cristeira para presentear os netos sempre que a visitavam. 
Do mesmo modo, minha tia-avó, aos oitenta anos, resolveu mudar de vida e de cidade dirigindo sua Marajó branca de Brasília, onde morava, até a nossa garagem. Sem celular, sem GPS, sem homem nenhum servindo de copiloto. Nem por isso deixou de casar, ter filhos e ter tempo para declamar poesias.
Afirmar, então, ser esta uma geração das mulheres incompatíveis com os homens é, no mínimo, deprimente. Não fui criada, nem nunca pensei que deveria agradar a homem nenhum. Cresci acreditando que deveria ser o melhor para mim mesma e se, dessa forma, viesse a encantar algum exemplar do sexo oposto, ótimo! 
Por outro lado, não vejo problema algum em fazer o almoço, tirar o lixo, varrer a casa e, entre uma tarefa e outra, parar para um chamego. Nunca me estressei com as cuecas, deixo que a máquina de lavar sofra com este afazer ou, na melhor das hipóteses, ensino o moço a lavá-las no banho. Toalha molhada é tão desconcertante quanto calcinha pendurada no box. Estas polêmicas são cansativas e chatas!
Tão chata quanto a mulher que é independente, autossuficiente, bem-sucedida e solitária.
O mundo não evoluiu só para nós, senhoras e senhoritas! Conheço muitos homens que vão ao supermercado, cozinham, passam pano na casa, recolhem os cocôs do cachorro no pátio e, entre uma tarefa e outra, param para uma pegada em frente à pia. Homens que não escolhem mulheres pela finura de suas canelas que, como dizia a minha vó, são a garantia das fêmeas trabalhadoras. 
Nunca recebi de algum companheiro uma intimação  para que abandonasse meu trabalho, meus hobbies, minhas crenças. Caso isto tivesse acontecido, certamente, o sujeito não ficaria tempo suficiente ao meu lado para terminar de ler a sua lista de imposições vexatórias. Contudo, isto não me levaria a enxergar todos os homens do mundo como irrecuperáveis manipuladores. 
Se a coisa não vai bem, se a incompatibilidade com o sexo oposto é uma constante em sua vida, isto não tem nada a ver com esta incrível geração. A culpa não é da preservação do machismo arcaico em detrimento à liberação do sexo frágil. A culpa é de ambos. Das intransigências diárias de cada um. Da incompetência em domar o orgulho. Da incapacidade unissex de lidar com as diferenças, sejam elas genéticas ou adquiridas.               
Acreditar que uma mulher seja incrível por ser independente, autossuficiente, bem sucedida mas que, por culpa disto, nenhum homem consegue viver ao seu lado, é o mesmo que acreditar no homem do saco que passava pelas ruas recolhendo menininhas teimosas que adoravam se aventurar pelo lado de fora do portão.
Credo! Nem minha vó cairia nessa.

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Claudinha Pintadinha


Vira e mexe alguém me pergunta de onde vem a inspiração para escrever , e a minha resposta é sempre igual: “a inspiração está no ar”. Aliás, a inspiração não é um dom especial, pelo contrário, ela está aí todos os dias, a cada segundo cutucando a mim, a você,ao vendedor de laranjas, ao gari sambista. A diferença é que enquanto eu a aproveito para escrever,  outro para vender mais, outro para transformar o trabalho em felicidade, alguns nem ousam experimentá-la. Enfim, diria que para inspirar-se basta poder inspirar, estar vivo.
Mas o mais extraordinário da inspiração é a versatilidade com que ela se manifesta. Você  pode inspirar-se tanto com um acontecimento feliz, quanto com uma decepção devastadora. Ouso afirmar que é em meio às maiores tristezas que surgem as mais belas inspirações.
Foi assim que, entre  tirar a roupa da máquina de lavar e correr até a cozinha para atender ao pedido de socorro do arroz que estava prestes a ser queimado, ela  inspirou-me esta crônica: a Galinha Pintadinha, ou melhor, Claudia Leitte.
No dia anterior havia visto uma imagem  na internet  comparando a cantora (na ocasião de sua participação na abertura da copa do mundo) com a personagem de desenho infantil.  Achei engraçado e criativo, no primeiro momento e somente no dia seguinte, em meio aos afazeres domésticos (nestes momentos surgem as maiores sacadas) me detive a analisar mais profundamente o fato.
Claudia Leitte é uma mulher perfeita do ponto de vista externo. Tem um corpão, um cabelão, um bocão, um olhão, um vozerão... E por que, com todo este kit valorizador de seres humanos, ela desperta tanta antipatia? Chega ser mordaz a forma com que muitos a detestam. Digo muitos, pois certamente ela tem numerosos fãs clubes por aí. Admiração não é uma conta exata, tipo “ou oito ou oitenta”, se fosse assim Hitler não teria tido seguidores, nem certos políticos deste país.
Mas, como eu estava dizendo, se eu fosse Claudia Leitte, se tivesse aquele corpão, aquele cabelão, aquele bocão, aquele olhão, aquele vozerão, estaria me perguntando: O que é que a Galinha Pintadinha tem que eu também tenho?
Depois de ter colocado água no arroz e voltado à árdua tarefa de estender  vinte pares de meias (juntinhos!), se eu pudesse responderia a ela que, embora os figurinos de ambas (dela e da galinha) fossem da mesma cor, o problema não é o que elas têm comum, e sim o que elas não têm. Galinha Pintadinha tem personalidade, Claudia Leitte não.
Não estou tirando os méritos da moça, além do kit de exuberância ela possui talento. Só não entendo por que a baiana cismou de incorporar personalidades como a de Beyoncé, Shakira, Christina Aguilera, (a lista não para por aí) menos a dela. A magia não funcionou, ficou aguada, insossa, fingida, exagerada. Uma miscelânea de adjetivos que definem o estilo “O que é que é isso? De onde  você veio? Aonde está tentando chegar?”  A musa brasileira perdeu o caminho e o tino.
Não sei dizer que estilo musical Claudia Leitte deveria assumir, isto é problema dela e do empresário,  só sei que passa da hora dela parar de tentar ser quem não é, e ser ela mesma.
Uma pessoa desprovida de personalidade não consegue sustentar a imagem construída. A credibilidade cai por terra junto com o respeito e só o que fica em pé é um estereótipo capenga. E olha que estamos falando de alguém que nasceu com o “kit” virado pra lua, imagine a catástrofe que se dá quando meros terráqueos tentam ser o que não são.
Mas, no final de tudo, depois das meias desparceiradas e arroz chamuscado, despontou em mim uma admiração (jamais sentida) pela autenticidade de uma artista brasileira. Alguém sabe como posso conseguir um autógrafo da Galinha Pintadinha?

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Torcer e namorar



Há poucos dias me perguntaram o que penso sobre a copa do mundo ser sediada no Brasil e, se eu irei  torcer pela nossa seleção.  Não precisei pensar, nem analisar a situação antes de responder, discordei imediatamente ao saber da confirmação de que a copa de 2014 aconteceria em meu país. Não concordo com nada do que tenha sido feito ou dito em defesa desta “jogada” diplomática, política e totalmente incabível para o momento e a situação caótica em que encontra-se a nossa sociedade.
Entretanto, antagonicamente,  se a resposta ao primeiro questionamento foi NÃO, a  do segundo foi SIM. Não sou hipócrita em afirmar que não vou torcer pela nossa seleção.
Numa analogia barata, eu diria que não torcer pela seleção brasileira por conta das  sem-vergonhices dos governantes do país,  seria o mesmo que não crer mais em Deus por discordar das diretrizes dos dirigentes da igreja na qual fui batizada. 
Torcerei pela nossa seleção sim, senhores. Nenhum radicalismo é forte o suficiente para anular certos sentimentos adquiridos ainda no berço. Eu não tinha a menor ideia do que era futebol,   quando via meu pai e minha mãe pararem todos os seus afazeres para gritarem em frente à televisão com os homenzinhos vestidos de verde e amarelo, para que eles acertassem o caminho e levassem a bola até a rede. Agora não vai ser diferente.
Por coincidência,  o primeiro jogo do Brasil caiu bem no dia dos namorados trazendo uma mistura de emoções que, certamente, farão todos os corações pulsarem de um jeito diferente.
E por falar em coração, assim como esta copa do mundo, namorar tens seus prós e contras.  Aliás, embora as campanhas comerciais ilustrem a data com os coraçõezinhos  vermelhos da paixão  e romantismo, o que se vê no dia a dia dos casais é um pouco diferente. 
Sou uma namoradeira convicta, gosto de ter com quem confidenciar meus anseios, trocar ideias sobre projetos profissionais e viagens inusitadas. Gosto de ter em quem pensar , para quem me arrumar e contesto quando ouço falarem que a mulher se arruma para as outras mulheres.  Me arrumo para mim, pensando nele. 
Gosto de companhia para ir ao cinema, para ir ao shopping, para ir ao supermercado, ainda que ele só aprecie o primeiro item da lista, gosto da incompatibilidade que me faz ter pressa na hora das compras, mas me permite passar pelo caixa de mãos dadas.
Gosto de ter para quem ligar no meio da noite para falar sobre o sonho que acabei de sonhar. Gosto de ser acordada nas primeiras horas da manhã para receber uma mensagem de bom dia, com frases de amor e malícia. Gosto de dormir junto, de roubar o cobertor e brigar pelo pé descoberto. 
Gosto de acordar com alguém, preparar o café da manhã e fazer disto a minha rotina e não um momento romântico qualquer. Gosto de receber o café na cama e sujar a camiseta (cadê o pijama?) de doce de leite que escorreu da banana.
Gosto de dizer “eu te amo” e que este alguém não seja parente ou amigo. Gosto de ouvir eu “te amo” de quem me dá tesão. 
Gosto de ter alguém disponível que, por mais que tenha compromissos , me tenha como favorita em sua agenda.  
Quem mais se encaixaria nesta minha lista de delícias do que um namorado? 
Você deve estar pensando:  e da lista dos contras, esqueceu?  Não, eu não esqueci, aliás, também gosto de avisar a quem acha que namoro é só coraçõezinhos vermelhos:  você vai se dar mal.
Para namorar é preciso ter saco, paciência, inteligência, maturidade, autocontrole...E esta não é uma tarefa só do outro, é sua também. 

Namorar as vezes irrita, incomoda, sufoca, e, admito, que até desperta aquela vontade de ser ímpar e viver sozinha para sempre. Mas,exatamente, as diferenças e, consequentemente, a instabilidade é que instigam, excitam, incendeiam.
Assim como à seleção brasileira, desde muito pequena,  eu amo estar apaixonada, independentemente dos contras,  portanto, neste dia 12 eu vou torcer e namorar.

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O show tem que continuar




Das minhas músicas preferidas, da época em que as músicas eram poesias cantadas que marcariam época e se tornariam imortais, “O Bêbado e a Equilibrista”, sem dúvida, está nas primeiras colocações da lista.

Numa parceria  de João Bosco e Aldir Blanc, a música, além de ser um berro nos ouvidos da ditadura militar vigente na época, é um hino de esperança inspirado pela morte de Charles Chaplin, em 1977. 
“O bêbado com chapéu-coco fazia irreverências mil pra noite do Brasil”. A música é linda, a letra é fantástica e para mim cabe inteirinha neste momento. 
Estamos vivendo outra vez uma ditadura. Não uma ditadura militar, mas um regime onde o governante aglutina todos os poderes, o que não deixa de ser a mesma coisa.  
Não vemos aqui um cerceamento dos direitos individuais, pelo menos não até agora. Pelo contrário, assistimos a um desregramento sociocultural conveniente ao sistema alienante do governo. Ou seja, vivemos numa ditadura às avessas disfarçada de democracia.
Aristóteles e Platão contaram lá atrás a história do ditador como um indivíduo que ganha o controle social e político pelo uso da força e da fraude sobrepondo regras estabelecidas para perpetuar o poder. Alguém já viu este “remake” na versão 3D brasileira? Aposto que sim. 
Não cabe mais a postura de pessoas que fingem que vai tudo bem obrigado! Pessoas que esperam sentadas em frente às suas janelas pelo momento em que a senhora Justiça toque a sirene, ocupe as ruas e dê o toque de recolher aos ditadores. 
Não dá para engolir mais o fato de que pessoas fiquem impassíveis diante de todas e tantas aberrações que vêm devastando os valores sociais. 
Levanta-se a bandeira da degradação do meio ambiente e todos batem no peito para fazer barulho e dizer que estão de olho nos predadores, o que é muito bacana e louvável. Mas quando se trata da degradação social, da ação direta e exterminadora dos princípios morais e éticos dos indivíduos da nossa sociedade, a maioria finge que não ouve, que não vê, não faz barulho, não quer se meter. São vítimas da propaganda subliminar criada pelos meios de comunicação para serem introduzidas no inconsciente coletivo. Também chamados Idiocratas.
Ouso e, ao mesmo tempo, lastimo em afirmar que, na miscigenação das várias raças colonizadoras deste país, o povo brasileiro constituiu-se numa linhagem de sangue ralo e morno, que o torna apático e submisso. Presa fácil para os dentes afiados dos tiranos.
Por tudo isto lembrei da música,  porque  a minha esperança  sobre o futuro deste  país encontra-se na corda bamba sem sombrinha,  e também, porque, tal qual Chaplin para João Bosco, a grande inspiração da minha vida está partindo.
Como é difícil compreender que o show de todo artista tem que continuar.

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Da incerteza do certo



Do velho, mas sempre recomendado, exercício de conhecer-se a si mesmo, confrontar-se com as nossas expectativas  com o propósito de escolher quais valem a pena manter na prateleira intitulada “desejos possíveis” e quais jogar na lixeira da desistência, é apenas um dos embates diários em nossas batalhas pessoais.
Expectativa é algo extremamente complexo de se lidar, pois além das que você já alimenta por si só, tem as que os outros alimentam por você, sobre você e todas as apostas que deveriam importar apenas a você. Ou seja, como se não bastasse nossas próprias expectativas sobre os nossos anseios para nos deixar ansiosos, tem a expectativa dos outros para nos enlouquecer de vez.
Certamente, de todas expectativas da minha, da sua, da vida de qualquer ser humano, ver o amor vingar é uma das que ocupam lugar de destaque na  tal prateleira dos desejos pessoais. Um amor que dê certo, de todos os objetos, é o nosso xodó!
E é exatamente a expectativa de encontrar o amor perfeito que desencadeia nossas maiores aflições e, intoleravelmente, o maior número de palpites alheios.
Quem já não ouviu, no auge de uma avassaladora paixão, alguém soprar-lhe nos ouvidos o vento odioso da duvida: “Você acha que isto vai dar certo?”.
Um minuto após o nocaute você olha para pessoa, dá um sorriso tonto de quem acabou de levantar da lona, e pensa em como rebater à altura o golpe baixo arremessado diretamente em seu coração.
Lógico que não! Nem você, nem eu, nem o intrometido  que resolveu antecipar o futuro, do qual  a única coisa que sabemos é que é incerto.  Ninguém poderá   garantir que “isto”, que é como sua grande paixão foi resumida, vai se transformar no amor perfeito e dar certo.
Claro que esta é a expectativa e, consequentemente, a parte aflitiva de qualquer relação. Ninguém vê os dias, meses, anos passarem ao lado de uma pessoa pensando: “isto não vai dar certo.” A menos que seja masoquista! Por outro lado, dias, meses, anos ao lado de alguém não garantem ter sido a escolha certa, o amor perfeito, nem coisa nenhuma. Pelo contrário, o que pareceu ser  certo por um razoável período de tempo, pode passar a dar errado de uma hora para outra. 
Temos mania de perseguir o certo, de tentar encalçá-lo no esconderijo secreto das coisas raras  e expô-lo publicamente como um troféu de nossa vitória certeira. “Estão vendo, eu sei fazer a escolha certa!” Como se a vida fosse imutável. Como se tudo não se transformasse a todo instante, até os sentimentos. 
Confesso que, por várias vezes, a pressão da expectativa dos outros sobre as minhas próprias expectativas, quase me empurrou precipício abaixo. Em muitos momentos pensei em descartar anseios e sentimentos, porque algum guru das emoções achou, por bem, abrir as cartas do meu futuro incerto. Sorte que a teimosia é uma característica que me ajuda em certos casos. Teimei, não desisti, persisti.
Se deu certo? De uma forma ou de outra deu.Aconteceu do jeito que tinha que acontecer,  durou pelo período que deveria durar e que gosto de chamar de “tempo certo”. Porque o tempo perfeito não é contado pelo número de dias, e sim pela intensidade com que os mesmos são vividos.
Não descarto os grandes anseios da estante, mas na prateleira abaixo delas  gosto de colecionar os momentos especiais, que é para quando poeira da dúvida se impregnar sobre as expectativas mais incertas
, eles continuem embelezando.


                                                                                   

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Nonsense




Alguns momentos na história política e social de um país despertam reações , desencadeiam movimentos, são válvulas propulsoras da evolução, verdeiros estopins. Bem ou mal, alguns gargalos sociais são providenciais para causar a pressão necessária e explodir a rolha. 
Como bem lembrou em uma entrevista o imortal ator José Wilker, a época da ditadura militar foi um estimulante período de criação artística. Certamente, as vozes, as canções, as encenações foram as armas mais  poderosas que digladiaram magistralmente contra o sistema castrador daquele período. Tanto  que sobrevivem e emocionam até nos dias de hoje.
Fiz este interlúdio para chegar ao ponto que tem me feito perder o ponto.  Quem já tentou transformar clara de ovo em neve sabe que, por um motivo ou outro,  em algum momento ela desanda, dessora.  É exatamente assim que me encontro,  desandada, ou, se preferirem, estou em estado de dessoramento por conta do atual momento da história do nosso país.
Sinto-me estupefata, emudecida, inebriada, embasbacada, abilolada... Nunca foi tão fácil encontrar adjetivos para expressar a pasmaceira que me assola diante dos fatos e acontecimentos prosaicos que vêm se desenrolando, dia após dia, em nossa malfadada sociedade.
Tentando buscar um sentido e até,  quem sabe, uma solução para tamanha sucessão de medidas e mídias escabrosas, acabei me dando conta de que o país vive o primeiro período Nonsense da história. Ou seja, o sentido é  que nada mais faça sentido neste país. Sentiu?
E neste nada inclua-se tudo. A começar e terminar pela postura da nossa “presidenta”.  “Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça!” Mera coincidência? Nada é casual no sistema Nonsense atual. Alguém ainda mantém a cabeça intacta? Rogo que sim.
Enquanto a ditadura acabou ditando novos estilos e descortinando grandes talentos, o  sistema atual vigente está desbaratinando as mentes. Se a classe alta está coreografando o Lepo Lepo o que esperar da baixa? Quero dar baixa! Ou melhor, quero alta! Uma aposentadoria por falta de inspiração. Sou vítima da conspiração.
Chego a pensar que deva ser um castigo, resposta ao meu desejo larápio, inegavelmente latente. Sempre tive a curiosidade de saber qual seria a minha reação caso uma gangue alienígena resolvesse visitar o planeta  ou, num caso bem específico, aterrissasse no Brasil.
Confesso que desejei que  algo surpreendente e inesperado acontecesse. Quem sabe viver fantasiosamente um suspense ficção... Mas me enganei redondamente ao pensar que o perigo viria das alturas. Depois de conhecer a  grande pensadora Valesca Popozuda descobri que  a maior ameaça vinha do chão.
Perdi a noção! Viva o período Nonsense!


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Super Pessoas



Vestia um vestidinho xadrez, meias ¾ brancas e sapatos pretos estilo boneca. Os olhos tinham a cor da inocência e embora fossem negros como a jabuticaba,  refletiam a esperança ingênua de quem enxerga a vida na cor azul. Esta era eu, aos dez anos de idade.
Se fosse escolher uma época da vida a qual voltar, voltaria exatamente para o momento capturado naquela foto, que vive guardada na caixa de fotografias de minha mãe, e de lá não sairia nunca mais. Quero ter dez anos por toda a vida! Algum gênio da lâmpada se habilita?
Tá vendo? Quem, com mais de dez anos vividos, dá crédito a histórias bobas de gênios prepotentes, mas potentes?
Passou dos dez a coisa começa a mudar, literalmente, de figura. De Walt Disney para Malhação  Pensou em Harry Potter?  Considero a saga do menino bruxo um oásis no meio do atual deserto da criatividade juvenil.  Aliás, preciso retificar esta frase: Harry Potter e Senhor dos Anéis são oásis no atual deserto da criatividade de qualquer idade. Mas como não se pode viver num oásis a vida toda,  é preciso encarar as malhações.
Exatamente disto é que não quero mais brincar. De exercitar minhas preciosas esperança , perseverança  e paciência num mundo que perdeu a graça, para mim, e o crédito também.
Adulta que sou, olhando a criança que fui, me dou conta de que passei a não acreditar em muita coisa, tanto quanto no gênio que satisfaz os três desejos.
Olho para os vilões que roubaram de mim estas crenças, muitos com suas imagens postadas em cartazes chamativos, quem dera fossem anúncios de captura com direito a recompensa.  Mas não, os vilões da minha maturidade não estão à caça, andam a solta impunemente. Todos tão bem disfarçados em suas imagens impecáveis, ora santos; ora heróis; ora amigos. São tantos.
Muitos me fizeram acreditar em sua genialidade, até, que entre um descuido e outro,  me deixaram descobrir sua verdadeira identidade. Nem um deles tinha a doçura de Clark kent no olhar. Não que eu esperasse encontrar super homens ou super mulheres neste mundo. Até porque,  junto com o gênio deixei de acreditar em super heróis, depois dos dez anos. Porém,  uma coisa terrível aconteceu depois disto,  passei a acreditar em super pessoas.
Afinal,  pensava eu, é tão simples e bacana ser uma pessoa super. Super sincera, super simpática, super honesta, super educada,  super bondosa, super inteligente, super feliz...Quando é que eu iria imaginar que chegaria ao ponto de descobrir que elas não existem?
Certo, concordo que fui muito rude no parágrafo acima. Super pessoas existem sim, mas são tão raras quanto a Kryptonita e, por serem a minoria neste mundo tão vasto, correm risco de extinção.
A atmosfera que envolve a Terra, dos países às cidadelas, está densa demais para os seres sentimentalistas. Está difícil respirar o ar poluído pelas pessoas que são falsas, desonestas, mal educadas, maldosas, ignorantes e infelizes...as que povoam o mundo e não são super. Sinto-me asfixiada.
Mas, por sorte, tem uma coisa que nunca deixei de acreditar: disco voador. Então, não se surpreendam ao ouvirem dizer que me mudei para um outro planeta.

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Um estranho verão


Respeito quem gosta de verão, assim como quem prefere o inverno e sigo calada com o meu outono amado. Mas este calor está indo além da simples controvérsia sobre qual a melhor estação.
Há algo muito diferente no ar deste verão estorricante, além da legião dos insetos voadores noturnos e do implacável mosquito da Dengue. Há um silêncio assustador que nem as escandalosas trovoadas conseguem dissipar. Se houvesse um vulcão adormecido pelos litorais deste oceano atlântico, apostaria que ele está prestes a despertar. 
Não sou dada a sensacionalismo e nem caio em balelas proféticas sobre o extermínio da humanidade. Quase tive um ataque de riso e raiva ao assistir o filme 2012, enquanto contabilizava o número de cenas hilárias que transformaram a teoria Maia numa comédia de quinta.
Geralmente sou mais cética do que crente. Entre acreditar nisto ou naquilo, opto por observar de cima do muro das minhas interrogações.
Mas há algo fora do lugar e não são as gordurinhas que brigam com o biquíni. Há uma ameaça silenciosa que nem o ventilador ou ar condicionado conseguem disfarçar.
Há algo tão estranho neste verão que chego a pensar que houve um deslocamento no inferno e ele veio parar exatamente aqui na Terra, pois, além do calor infernal, nunca vi tanto parente do capeta desfilando por aí.
O calor insuportável torna as pessoa, insuportavelmente, mais mal humoradas e pré-dispostas a cometerem graves delitos. Numa tarde,  em que o sol estava mais prepotente do que nunca, vi dois senhores quase se engalfinharem na disputa pelo galho de uma árvore. O mísero galho não tinha flores, nem frutos, mas dava a sombra necessária para proteger um veículo, apenas um veículo. Não fiquei para saber o resultado da briga, mas saí dali pensando em produzir árvores artificiais e faturar uma boa grana alugando-as por hora.
Não me levem a sério, é que acabei de acordar com a sensação de ter levado uma surra....aliás, esta é mais uma das estranhas façanhas deste estranho verão, além de ter transformado o meu colchão num modelo térmico que superaquece sem que eu precise plugá-lo na tomada.
Normalmente não sou de reclamar. Pratico o poder do pensamento positivo e juro que tentei a técnica de ajustar a mente na temperatura desejada para manter o corpo fresco. Mas não funcionou. Sinto-me um dinossauro que solta fogo pelas ventas. Uma baleia que esguicha suor por todos os poros. Um bicho preguiça que deve ser esquecido em seu galho de árvore, por favor.
Algo me diz que o mundo pode acabar a qualquer momento e que estou prestes a virar uma estranha espécie extinta num estranho verão. 
Com licença, acho que vou fazer uma fotinho para as futuras civilizações. De biquíni, em frente ao espelho fazendo biquinho ou de shortinho com a legenda: #bora#malhar#academia#fui#. O que vocês acham?
Credo, este verão está me deixando mesmo estranha, muito estranha....

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O último capítulo


Dias atrás assisti ao filme “Deixe a luz acesa” do diretor Ira Sachs, com a parceria do brasileiro  Maurício Zacharias,  que expôs corajosamente sua conturbada relação amorosa com outro homem.
É um filme intenso e tenso. Não por causa da relação homossexual, pelo contrário, o homossexualismo passa longe da estante onde se arquiva os problemas mais insolúveis da vida. Os roteiristas deslizam sobre esta questão social, deixando claro que este tipo de preconceito está muito bem assentado em grande parte do mundo. A tensão se dá pelo envolvimento que um dos amantes tem com o crack.
Espantosamente fiquei sabendo, através das redes sociais, sobre a repercussão do último capítulo de uma novela brasileira  em que se daria (e se deu) o beijo gay. Achei uma coisa estranha, quase bizarra, para não dizer patética. Pessoas, nesta época da existência humana, em meio ao ápice das invenções tecnológicas e descobertas científicas ainda se surpreendem, se chocam ou precisam levantar bandeiras em defesa do direito de amar e, logicamente, beijar pessoas do mesmo sexo?! É como entrar no túnel do tempo e cair no meio da manifestação da queima dos sutiãs. Senti-me vivendo em plena década de 60.
Entre o casal do filme, a homossexualidade foi um aspecto facilmente contornado e assumido. As cenas tórridas, os beijos e abraços explícitos, as manifestações amorosas  não foram feitas com a intenção de  chocar. O que chocou foi a  luta incansável de um dos amantes para salvar  o parceiro do fim presumível da droga. O que, igualmente, choca quando acontece na vida real com casais héteros.  Aliás, vii pouquíssimas coisas mais chocantes do que isto.
As cenas de um baile funk  é o que me choca. A imagem de um traficante é o que me repugna. A visão de um assassino é o que me revolta.  A traição, a desonestidade e a baixaria sem censura da televisão é o que me incomoda.
O foco está errado!  Pessoas ainda preferem ter um viciado ou um marginal com o seu sobrenome do que um homossexual.  Cada vez mais pais deste Brasil afora terão de conviver com o fato de terem gerado um ser diferente do que, retrogradamente, ainda se convenciona como normal.  E ( pelo amor de Deus!), terão que assumir a responsabilidade de amá-lo  acima de qualquer olhar torto, risinho de deboche e comentário inconveniente de parente ou vizinho infeliz .
Era desta forma natural,  que eu gostaria de ver a homossexualidade ser apresentada no horário nobre. Como um caso de família corriqueiro ( e respeitado) e não como uma anomalia a ser perdoada no último capítulo por um pai (que não era nenhum exemplo a ser seguido) vencido pelo cansaço.
Adoro finais felizes, quem não gosta? Chorar em cadeia nacional (preciso admitir) é fenomenal! 
Mas acho triste que os homossexuais precisem estourar os números da audiência da Rede Globo para mostrarem que são normais, apenas no último dia.





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Mochileiros camaradas


Se tivesse de responder por que  crer em anjos, eu responderia “e por que não crer?”.
A vida é pesada para todo mundo. Independente de que se ande de bicicleta  ou de jatinho, carregá-la exige muita força e disposição, então, alguém aqui é louco de dispensar um bom par de asas? 
Tenho meus anjos. Falo no plural, pois desconfio que no auxílio dos escritores e artistas, papai do céu deva ter enviado  logo dois de uma vez. Aja asas para quem escolhe sobreviver de lirismo neste mundo!
Falo com eles diariamente, mas não  sigo a tradição de fazer isto antes de dormir. Anos e anos de dias estafantes me ensinaram que, na maioria das vezes, mergulho no sono assim que a minha cabeça afunda no travesseiro. O que acaba invalidando o ritual noturno. Entre falas desconexas que misturam  preces de agradecimento com as  cenas tórridas da inapagável interpretação de Ben Affleck  no filme que acabo de assistir , opto pelas conversas angelicais na sobriedade do dia.
Para aqueles que recriminam os relacionamentos íntimos com a divindade, garanto que não há nada mais salutar de se manter. Invariavelmente você poderá falar do que quiser, como quiser, pelo tempo que desejar , sem réplicas inconvenientes que lhe fazem perder o fio da meada, a paciência e a razão.
Falar com os anjos é lançar os queixumes na atmosfera esperando que caiam bem longe de você. Claro que não haverá uma resposta efetiva avisando que seu recado foi entendido e os seus problemas acabaram de explodir no fundo do Oceano Pacífico, CÂMBIO. Mas se você sabe que seres desta hierarquia não são dados a trambique , acaba acreditando que suas aflições, certamente,  foram comidas pelos tubarões. Por que você acha que eles são tão estressadinhos?
Posso delinear anjos de asas, conforme as figurinhas de chicletes, ou de mochila contendo vários manuais de como ajudar seres problemáticos, nascidos no planeta Terra, que não sabem lidar com os problemas que pensaram que nunca precisariam lidar.
 Ou, o que é mais bacana, posso criar um anjo para cada dia da semana, conforme o meu estado de espirito. Se estou deprimida, quero um anjo que deite comigo no escuro do quarto e finja que o sol de quarenta graus, que queima lá fora, está apagado. Se estou extasiante,  quero um anjo com quem divida  uma, ou mais,  garrafa de vinho e converse pela madrugada afora, até que o sol nos expulse da rua. 
Embora, quando a ocasião exige, eles sejam teimosos e intransigentes. Cansei de pedir que me livrassem de certos sentimentos e, confesso, até, de pessoas. É que temos uma tendência comodista. Remexeu um pouquinho na constância do nosso sono, acordou a insônia e pôs a ansiedade para fazer serenata para nós,já  queremos eliminar o sujeito. E como não dá para deletar imagens de carne e osso no mundo real, a gente grita para o socorro celestial.
Não foi uma,  nem duas, as vezes que os meus camaradas mochileiros, fizeram a dança do dedinho (Nã na ni na não!)  e, logo após, me apontaram o indicador e a ordem:  “Fique quietinha onde está. Não tente sair desta situação ou vai ser pior para você”. E me deixaram lá, algemada ao meu medo de sofrer.
O profissionalismo dos office boys do céu é o que há. Negócios, negócios, amizade à parte. 
Estou falando em anjos, mas poderia estar dissertando sobre física quântica e o poder incalculável das energias,  o que, talvez, fosse mais aceitável e contagiante. Seres humanos gostam de dados, estatísticas e do glamour das teorias avalizadas pela ciência. 
Mas prefiro deste jeito, do meu jeito de crer que no poder do invisível. Da "fantasticidade" que as pessoas possuem de materializarem pensamentos, sejam bons ou ruins. 
Nunca vi o diabo, mas já senti sua presença de braços dados com muita gente por aí. Por isto escolhi os anjos para minha companhia, logo dois de uma vez, pois não é fácil sobreviver de lirismo neste mundo.



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Eu, hein!


Com tantos novos modelos de celular sendo lançados no mercado, tantas novas funções ultradimensionais compactadas nos amiguinhos retangulares, tantas capas lindas e  fashion para enfeitá-los,  tanta parceria, fidelidade e blá-blá-blá. Só tenho que me render ao fato dele estar roubando as cenas.
Eu lá sou louca de me meter entre o casal embaixo do guarda-sol (sob o o sol em em frente ao oceano azul e límpido) e dizer para a mulher largar seu amiguinho portátil vestido de oncinha e se ligar no marido, namorado, ficante (sei lá eu) solitariamente sentado na muda cadeira de praia? 
Quem sou eu para tentar resolver um triângulo amoroso, no qual (não resta dúvidas) ela jamais abdicará de seu amado telemóvel? Eu, uma ( literalmente) estranha que acha que é muito mais interessante ( e inteligente) ficar conectada nas imagens vivas da beira do mar, do que ficar brigando com o sol, tentando encobri-lo para conseguir ver as cenas miúdas da tela que dá acesso ao portal das (inalcançáveis) redes sociais.
Confesso que a vontade louca veio me cutucar na cadeira: “Vai lá e avisa ela que, enquanto se delicia teclando em seu mundinho virtual, ele se delicia vendo duas beldades jogando frescobol!” Eu, hein!  Em briga de homem,mulher e celular, não meto a colher para não me queimar. Levei a vontade para se afogar no mar.
Da rústica janela da pousada que emoldura a ousadia da mata verde (a se postar entre o céu e o oceano), ao ver pessoas passarem de cabeças baixas e olhos voltados para as suas janelinhas portáteis e luminosas de última geração... Quem sou eu para obedecer (mais uma vez) a vontade desvairada que me incita a gritar: “Hei, vocês estão perdendo a mais perfeita conexão que existe. Olhem em volta!”?  Eu ,hein! Quem sou eu para criar intriga entre alguém e o celular? A vontade virou pipa e se perdeu no ar.
Do restaurante à beira mar (com os meus pés exibidos calçando areia), ao ver os deliciosos pratos sendo capturados pelas dezenas de câmeras embutidas nos estimados aparelhos, sendo postados ( em tempo real) para causarem inveja a bocas que não podem comê-los... Quem sou eu para dar ouvidos à vontade malcriada que me manda dizer: “ Saboreiem a delícia  deste momento sem perder tempo tentando publicá-lo, antes que ela esfrie!”? Eu, hein! A hora da refeição é sagrada, ainda mais quando a prece de agradecimento é ao deus Celular.”
E se  eles estão aí, inteligentes, lindos, práticos, eficientes,  ocupando todos os lugares possíveis e inimagináveis do mundo e da vida, eu é que não vou querer disputar uma guerra com seus fiéis escudeiros, os donos. 
Quem sou eu para erguer a bandeira das emoções viscerais?  Só porque me indigno ao ver que, enquanto os pássaros dançam maravilhosamente no céu,  perde-se a  evolução da coreografia  tentado capturá-los  nas gaiolas de tantos megapixels. Que a música que tenta tocar os corações, no pub, perde-se confusa entre tantas visões encobertas por tapa-olhos digitais.  Que as gargalhadas que libertam-se freneticamente para brincar na rua, emudecem imediatamente ao terem de pousar para as lentes estáticas. Que os beijos apaixonados viram prosaicas encenações sempre que se tenta registrá-los para depois compartilhá-los.
Quem sou eu para alertar que o tempo passa rápido demais? Que o único lugar que podemos arquivá-lo é na memória das emoções, efetivamente, vivenciadas. E o que é melhor,  sem que raio nenhum de  bateria nos deixe na mão na hora H.
Eu, hein!  Arrastei a vontade (pelos cabelos) para dentro da minha caverna.



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Na janela


O calor exagerado empurrou-me para a janela à procura do vento. Debrucei-me nela e, enquanto meus cabelos dançavam refestelados e frescos, vi a vida passar.
Num curto espaço de tempo, em minutos rapidamente contados, ela parou, olhou para mim e, num misto de reprimenda e piedade, provocou-me: “ Há quanto tempo você não se debruça numa janela para me ver passar?”
Meus cotovelos sentiram a fisgada dolorida da culpa. Nunca mais tinham descansado sobre um peitoril sem pretensão alguma, a não ser ver a vida desfilar. Meu coração encolheu-se todo ao ouvir a gargalhada do tempo que, de braços dados com ela, mirava-me inconformado da rua, em frente a janela. Meus olhos se afogaram na emoção. Há muito tempo não aproveito o tempo para olhar, sem pressa, a vida.
Descubro, então, o porquê do meu fascínio pelas bonecas de gesso de cores e roupas extravagantes, as chamadas namoradeiras e fofoqueiras. Elas me remetem à displicência ao chamado compulsório das horas e me relembram um passado remoto, no qual postar-se na janela era um dos passatempos preferidos da alma. Vejo almas cheias de tempo e de vida nas beldades de gesso.
As janelas perderam o sentido. De portais para outras dimensões, que iam da casa vizinha ao fim da rua, até o horizonte da serra nua, foram rebaixadas a molduras de telas vazias, passagem de ar, motivos para cortinas suntuosas e nada mais.
Janelas virtuais sucederam as velhas cúmplices de madeira, onde se debruça uma raça estranha que foi desenvolvida no confuso burburinho da evolução e perde o tempo, que reclama não ter, vislumbrando pessoas inertes e paisagens intocáveis de sua vida “fake”.
No dezembro quente, em que me debrucei na janela, desejei que outros olhos ali estivessem a furtar comigo nacos da vida que corre solta nas ruas.  Que juntos fofocássemos sobre o que andam fazendo os cachorros vagabundos, os gatos vadios, as corujas boêmias, as estrelas festeiras, a lua vedete. Que ouvíssemos o coral das cigarras afinadas, o silvo dos grilos solitários, o canto  atrasado do galo que não ajustou o relógio. Que nossos cotovelos tivessem cicatrizes feitas pelo tempo que gastamos namorando num peitoril áspero e não numa tela plana.
Tempo que se perdeu de nós e ri inconformado em frente a janela que nunca mais nos debruçamos para ver a vida passar, sem pressa.

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No banheiro



O que encantaria você neste momento? Digo “neste momento” porque os encantamentos mudam à medida em que o tempo passa e a vida vai se mostrando como realmente é, invariavelmente diferente do que queremos ou achamos que ela seja. 
De todos os encantos, a singeleza é o que tem me arrebatado. Coisas que, de tão simples, acabam tornando-se esplendorosas diante das espetacularidade das criações do mundo atual. Meu último encantamento se deu na intimidade do banheiro. Aliás, elejo o banheiro como o lugar onde a minha privacidade é mais respeitada e, consequentemente, onde acontecem os maiores fenômenos inspiradores.
Fechada a porta, um banheiro não só garante a você minutos de total onipresença em si mesmo, como mantém protegidos todos os seus pensamentos, impressões e expressões.
Costumo ter grandes sacadas para lidar com a complexidade da vida, na solidão destes pequenos espaços azulejados. É onde consigo aliviar a cólica das emoções negativas digeridas durante o longo dia de convivência compulsória. É para onde corro quando preciso chorar anonimamente ou quando preciso soltar a gargalhada que tive que engolir publicamente.
É permitido suar,  fazer caretas, empastar a cara e os cabelos,  raspar todos os pelos de qualquer parte do corpo, dentro do banheiro. Praticamente um confessionário sem punição. Ali nada é sacro, nem profano. Não há sentença  quando não existem outros olhos para julgar. 
Mas não foi com este espirito que entrei naquele cubículo público que me encantou. Entrei unicamente para satisfazer uma das necessidades fisiológicas inerentes a todos os seres humanos: xixi. Até que fechei a porta.
Num primeiro momento, meus olhos achavam não haver nada de novo naquele espaço suprimido. Nada que pudesse sobressaltá-los a ponto de levarem o coração a enxergar também. Porém, passados os primeiros segundos em que me ocupei com as atividades costumeiras de pendurar a bolsa e descer o zíper, mirei a porta fechada, e foi, então, que me encantei.
Fixado na porta, na altura dos olhos de quem ali sentasse, um retângulo de papel  branco com bordas cor de rosa exibia um texto  falando sobre o mar. Não era exatamente um poema, tampouco um artigo tratando de assuntos litorâneos.  Era uma redação simples e profunda ao mesmo tempo, escrita por um homem.  A assinatura  desvendava o sexo, mas não o autor. Certamente  um apaixonado pelo mar que permitiu, brilhantemente, dividir seu sentimento naquele minúsculo compartimento íntimo.  
Sei que meu arrebatamento pode parecer exagero ou loucura. Eu mesma me senti abilolada ao me ver refletida no espelho, logo depois do acontecido. Meus olhos latejavam de euforia e a minha boca mantinha-se aberta no desejo de gritar pelo corredor a fora sobre a minha descoberta. E assim eu fiz. Contei a todos que encontrei  pelo caminho: Vocês não vão acreditar, tem poesia no banheiro! 
Sei que isto não é nenhuma novidade e que existem muitos banheiros cobertos de escritos do chão ao teto. Não foi a novidade que me tocou. Pelo contrário, acontece uma nova descoberta a cada minuto neste mundo, e a maioria nem me faz cocegas. Exatamente a singeleza da atitude foi que me encantou. 
Quem me dera poder acreditar num futuro em que possamos compartilhar belas emoções de forma tão arcaica por todo o mundo,inclusive dentro do banheiro.


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