Amar gay



Das coisas que mais gosto de fazer,dançar, sem dúvida, está entre os primeiros itens da lista . Infelizmente os ritmos que estão na moda não me fazem a cabeça e, automaticamente, não me animam os pés.
Noite destas, entretanto, quando o meu corpo todo pedia para ser sacudido numa pista de dança, alguém sugeriu um local onde rolava o estilo de música que gosto. Não pensei duas vezes, saí para dançar numa boate gay.
Imagino que alguns olhos que acabaram de ler o parágrafo acima tenham se esbugalhado, tanto quanto outros que não conseguiram disfarçar o susto, ao ouvirem-me dizer que dancei  num sábado à noite numa balada gay.
Mas esta é uma equação pra lá de simples, pelo menos para mim. A minha escolha sexual não determina que eu julgue e condene a predileção dos que (dizem) são diferentes de mim. Mas minha preferência cultural, e neste caso eu me refiro à música, determina que eu busque ouvir e dançar ritmos e sons que me agradem.  O DJ da boate gay não só satisfez o meu gosto musical, como me fez suar.
Não sou gay e não ponho em risco a minha preferência sexual (dita normal), por ter dançado no meio de homossexuais. Pelo contrário, a única coisa que poderia mudar e efetivamente mudou em mim, naquela noite, foi o fato de o meu corpo ter ido dormir satisfeito e, automaticamente,  o meu coração pulsantemente mais feliz.
O que não aconteceu na noite em que cometi o despautério de (tentar) dançar numa balada hétero do momento. Todo mundo merece passar pela situação de “o que é que eu estou fazendo aqui?”, que é para nunca mais cometer o mesmo erro. “Camaro amarelo” e “eu quero tchu, eu quero tcha” protagonizaram os meus pesadelos naquela noite, depois de ter fugido correndo de lá.
Mas deixando a música de lado, enquanto luzes coloridas focavam os rostos felizes dos pares do mesmo sexo, me perguntei  no que aqueles casais (ditos anormais) eram diferentes daqueles  (ditos normais)da balada sertaneja.  Deixando a questão sexual de lado, garanto que vi mais sentimento ali naquele recinto censurado do que nas coreografias porno sensuais que vi na balada socialmente correta. Sou capaz de afirmar, até,  que enxerguei o amor, do mais puro tipo de que o amor é feito, entre aqueles seres discriminados, enquanto na fatídica noite de “aí se eu te pego” vi somente a azaração, no sentido mais superficial do que seja querer alguém apenas por sexo.
E agora, deixando tudo isto de lado, sinto que um sentimentalismo puro sai dos corações dos homossexuais. Uma sensibilidade aguçada, típica de quem sofre o poder destrutivo da discriminação. Um romantismo raro, quase utópico,  de quem precisa acreditar que o amor é cura. Uma bondade espontânea, quase ingênua, de quem necessita provar que não é anômalo. Uma força tremenda, de quem precisa lutar para ser feliz. Uma inteligência sagaz, de quem sabe que existe mais mistério entre o céu e a Terra do que supõe qualquer filosofia.
Então, não tentem me convencer sobre a anormalidade do que quer que seja neste mundo em que a palavra NORMAL virou rótulo de produto adulterado. Não me olhem como se eu tivesse perdido o senso, o tino ou o status, por não estar nem aí ao ver duas pessoas do mesmo sexo se amando. Preocupo-me sim, quando vejo gente traindo, mentindo, humilhando, maltratando,roubando, matando. 
Quando vejo amor de todas as formas e maneiras que o amor pode, tão lindamente, se mostrar, eu vejo Deus!
Então não me digam que Deus condena os meus amigos e amados homossexuais que não escolheram ser como são, pois nasceram como Ele quis que nascessem. 
Não inventem leis  que os tornem  doentes diante uma sociedade patologicamente insana no que diz respeito a moral, valor e conduta.
Não me falem  em nome de um Deus que não é o meu, pois a única lei que o meu Deus prega é do amor entre os homens. E em nenhum momento ele determinou que deveria ser ,exclusivamente, entre sexos opostos.


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O despertar da pátria amada



Ao nascer no Brasil criaram-se laços inseparáveis entre mim e a pátria que passei a  amar, instintivamente, como um ventre do qual nasci. Sem que nenhuma gota de sangue nos ligasse, o Brasil tornaria-se parte de mim e eu parte dele, por toda a minha vida.
Contudo, derrotadamente, há algum tempo  larguei o Brasil de mão. Assim, como quem se afasta de uma mãe, mesmo amando-a, por não mais conseguir conviver com seu jeito e costumes. Como quem desiste de  resgatar um ser amado que se perdeu no meio do caminho.
Segui em frente minha caminhada predestinada a ser uma brasileira tentando ignorar tudo o que, ao longo deste trajeto, me fez sentir vontade de sentar, chorar e desistir. Fingindo não me afetar com as injustiças causadas por aquela que aprendi a chamar de minha pátria mãe gentil. Sofrendo por ter de admitir que algo havia saído errado no berço em que não escolhi nascer, mas do qual  preferiria me orgulhar.
Foi duro ver meu país ser subjugado, ironizado e discriminado lá fora. Afinal, um país não é simples  traçado  geográfico inserido no globo terrestre. O Brasil sou eu e todas as outras pessoas que  atribuem vida a ele.A vergonha era de mim, o fiasco era eu, o fracasso era meu, a tristeza era minha.
Ver o monstro da corrupção crescendo e prostituindo a mãe que deveria ser  justa e gentil sem que eu pudesse fazer nada, foi demais para mim. Perdi as forças de levantar a bandeira que estampa a riqueza que foi roubada, a beleza que foi desfigurada, o orgulho que foi rasgado.
Sem orgulho de ser brasileira me tornei uma filha apática e distante, vendo minha mãe se perder, dia a dia, pela televisão. Sentada sobre a dura estrutura de minha vida honesta vi o mal estuprando a minha pátria querida, enquanto gozava o êxtase diante de uma platéia entorpecida.
Vi policiais virando bandidos. Vi bandidos virando gente importante e rica. Vi a droga  invadindo  casas e aniquilando famílias.  Vi pessoas sem casa morrendo nas ruas. Vi pobres perecendo nas filas, dentro dos hospitais. Vi crianças crescendo por todos os lados, sem educação. Vi a moral ser assassinada em bailes funk. Vi a cultura ser torturada em alto-falantes. Vi o mal  fazendo o discurso em palanque. Vi o demônio sair das urnas para assumir o poder.
De ouvidos atentos, olhos inconformados, boca calada, minhas mãos atadas não puderam mais versar sobre a minha mãe estuprada. Até hoje.
Hoje eu volto a escrever sobre o Brasil. O Brasil que acordou do sono da inconsciência e grita, com milhares de vozes, por socorro. Hoje levanto a bandeira,  há muito  arriada no peito, e cubro de esperança as imagens distorcidas pelas lentes aliciadoras da televisão. 
Hoje minhas mãos se soltam das amarras da impotência para, trêmulas de emoção, registrarem o momento em que minha pátria amada despertou, cheia de promessa de voltar a ser o que um dia sonhei que ela fosse.
Hoje eu me encho de coragem e peço àqueles que não compreendem, nem ouvem a voz que clama  por R$ 0,20, que se olhem no espelho e, se não tiverem orelhas de burro, calculem o que poderia ter sido feito com cada centavo roubado por anos a fio  dos cidadãos honestos e sofridos  deste país.
Hoje eu quero invadir os portões do paraíso da corrupção e retomar, dos cofres dos demônios que lá vivem,  a riqueza da minha rica pátria para gozar da herança que  me é de direito desde que nela  nasci.
Hoje eu quero redescobrir minha terra adorada  e com orgulho poder dizer: "Entre outras mil, és tu Brasil, minha pátria amada!"

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Depois de Adão e Eva




Mesmo não crendo piamente na versão bíblica da criação sempre nutri um apreço pelo casal Adão e Eva. Talvez esta admiração se deva ao fato de ambos representarem desde sempre a atração e o envolvimento entre um homem e uma mulher. Alguém cogita a possibilidade de Adão não ter cantando Eva e Eva não ter cedido aos encantos de Adão, enquanto comiam a maçã? Eu não.
Tenho certeza que Adão e Eva se apaixonaram e namoraram por todo sempre que a minha imaginação permite que exista. Ainda que as escrituras religiosas tenham omitido estes pormenores sentimentais.
Gosto de pensar, assim, que o namoro surgiu com o mundo.
Fato que acabou sendo distorcido pela evolução. Em épocas arcaicas namorar chegou a ser condição de ascensão econômica e social. E pensar que muitas mocinhas foram obrigadas a namorar sem paixão para casar sem amor com os pretendentes dos pais. E que moços, da mesma forma, abdicaram de suas verdadeiras amadas para namorar mocinhas mais rentáveis.
Pois é, meus caros, a história nos conta que tentaram subornar o namoro rebaixando-o a um mero compromisso desprovido de emoção. O que, graças a Eros, o deus do amor (Cúpido para os mais chegados) não deu certo.
Namorar não é um estado civil a ser registrado em cartório ou servir de complemento no preenchimento da ficha vivencial de alguém. Muito menos um status de relacionamento sério. 
Como é que o Bam Bam Bam das redes sociais, o poderoso Facebook, não sabe que namorar é um relacionamento divertido? Namorar é um estado de espírito, quando este está extasiante. Um rompante descompassado do coração de escancarar suas portas e levar alguém especial para morar dentro dele.
Uma pena que existam muitas pessoas, muito mais do que meu coração gostaria, que ainda conservam tabus com relação ao namoro e fazem dele um critério a ser avaliado antes de decidirem entre estarem bem acompanhadas e mal sozinhas. Não necessariamente nesta ordem. 
Tal qual Lulu Santos, me faltam dedos pra contar. Só que a minha conta é de pessoas que temem despencar do barranco das emoções e se machucarem.  Tantos alguéns que se aposentaram da emoção de enamorar-se por outro alguém e se autocondenaram às ridículas convenções para não se sentirem ridículos, escolhendo viver no terreno plano e estéril da vida. 
Ou porque já namoraram, casaram, divorciaram e creem já terem representado todos os estados civis estabelecidos; ou porque namoraram, não casaram e acreditam que estão condenadas ao azar de nunca mais passearem de mãos dadas sob as luas cheias à beira mar.
Vibro de alegria ao encontrar sob os sóis das calçadas, senhores e senhoras condenados por suas idades avançadas desobedecendo às leis do desuniverso social, passeando de mãos dadas, enamorados.
Aliás, namorar deveria ser prescrição médica para a longevidade. Bálsamo para a cura de dezenas de males. Antídoto para o veneno da amargura. Máscara para o rejuvenescimento da pele. Unguento para o fortalecimento das articulações. Calmante para as dores do coração. 
Namorar deveria ser um exercício diário a ser praticado aos quinze, aos trinta, aos cinquenta, aos setenta anos, até que o coração pulse. 
Namorar sem se preocupar se vai dar certo, em casamento. Sem pensar no tempo: um ano, dez, um mês. Namorar porque entre o quem sabe e o talvez, ser feliz só é possível quando se escolhe o sim.
Não penso em Adão como marido, pai ou avô. Muito menos em Eva passando roupa, trocando fraldas ou tricotando numa cadeira de balanço. Vejo os dois, por todo o sempre, namorando felizes e só.
Gosto de pensar, assim, que a felicidade nasceu com o namoro.

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Eu vou fugir!




Nunca pensei que chegaria o dia de sentir vontade de naufragar em uma ilha deserta. Posso mesmo estar exagerando, pois não cheguei ao ponto de querer me isolar do mundo. Mas, de uns tempos para cá, vem batendo na porta das minhas escolhas o desejo de me afastar um pouco. 
Nunca pensei que pudesse sentir isto também. Achei até que não sobreviveria sem o burburinho da evolução e sem respirar o frenesi das descobertas tecnológicas.
Nunca me considerei jurássica, pelo contrário, sou adaptável a qualquer situação de qualquer ambiente, ainda que não possa inflar o peito, como muita gente gosta de fazer, e arrotar o fato de ter vivido anos em algum país mais desenvolvido do que o meu subjugado Brasil.
 Minha mente é tão aberta que vire e mexe me pego correndo para trancar algumas janelas, antes que maus ventos se aproveitem do meu descuido, me invadam e me derrubem.
Ou seja, trocando em miúdos, sempre me senti parte integrante do cenário deste novo mundo que está se delineando dia após dia numa velocidade inalcançável. Até agora, que,acho...cansei!
O ápice deste enfado se deu na última viagem que fiz. Aliás, sugiro a constância destas “fugidas despretensiosas” que causam o abandono do nosso colchão feito com a espuma da comodidade, para experimentar novos e desconhecidas densidades, intensidades e, automaticamente, o verdadeiro despertar.
Infelizmente, neste despertar não gostei do que vi. Algo do tipo: você acorda e se dá conta de que era melhor ter continuado dormindo, pois o pesadelo era menos feio do que a realidade. Preferia realmente não ter constatado, sem nenhuma margem de erro, o quanto as pessoas conectadas estão se desconectando. O quanto estamos ficando solitários vivendo, ironicamente, num planeta de 7 bilhões de pessoas.  O quanto o poder da tecnologia, de estar em todos e vários lugares ao mesmo tempo, está fazendo com que as pessoas deixem de  coexistir.
Refiro-me a coexistir no sentido literal da palavra, que a mim significa utilizar com toda intensidade possível o poder dos seis sentidos para se relacionar com o meio. Pessoas conectadas ouvem mal; pouco falam; olham, mas não veem; não sentem e (ouso instituir o sexto sentido) não pensam. 
Munidos de celular, iPed, iPod, tablet, netbook, notebook, ultrabook... pessoas vivem conectadas a cada segundo de todos os minutos acordados e até dormindo, em seus mundos virtuais. Por todos os lados de todos os lugares, calçadas, shoppings, praças, banheiros... para onde se olhe a vida está acontecendo no ciberespaço e não mais aqui.
Viagens são mais emocionantes quando compartilhadas no Facebook. Paisagens tornam-se mais lindas ao serem postadas no Facebook. Comer é mais prazeroso ao exibir o prato no Facebook. Sentir dor, raiva, medo, saudade, solidão fica mais fácil depois de expor-se para todo mundo no Facebook. Amigos são mais amados no Facebook. Pessoas são mais reais no Facebook.
Olhar alguém, conhecer alguém, falar com alguém passou a ser uma ferramenta da internet, da qual todos utilizam, enquanto não perdem tempo de fazer isto ao vivo, a cores, ao ritmo da respiração.
As caras estão cada vez mais fechadas, os sorrisos mais raros, os corpos mais rígidos, os movimentos mais curtos, as emoções mais contidas e as pessoas mais sozinhas.
Não gostei do que vi ao despertar na minha última viagem. Não gosto do que vejo todos os dias aos despertar na minha vida. Não estou pronta para me integrar ao pós-humanismo que me convida a abandonar a identidade sensível e a consciência emocional que me constituem, para me tornar um avatar, como os tantos que vejo por aí...E que me levam a querer abrir a porta das escolhas para atender o desejo latente que grita aqui dentro:
 —Eu vou fugir! 


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