A felicidade não precisa de gaveta



ESTAMOS vivendo a era da corrida da abastança. Não entendeu? Preste atenção!
Você conhece alguém que se contenta com aquilo que ganha e que, sendo assim, resolveu viver, literalmente, a vida?
Você tem algum amigo, ou amiga, que trabalha numa parte do dia e na outra tira para cuidar de si, de seus hobbies, de seus livros, de seus discos, de seus filmes, de suas plantas, de seus filhos...?
Claro que não! (Deixo uma pequena margem para a exceção). A grande maioria das pessoas não se permite mais ter tempo de sobra. A humanidade vive uma nova era da corrida do ouro. Só que desta vez a alquimia transformou o ouro em notas, papel, moeda, casa, carro, roupa... Roupa, carro, casa, moeda, papel, notas...
Minha nossa! O que mais as pessoas precisam para se convencer de que mesmo construindo um caixão cheio de gavetas não dá para carregar tudo isso. Nem sabemos para onde vamos. Muito menos quanto tempo ainda nos resta por aqui. Então, para que correr tanto atrás das únicas coisas que não levaremos conosco?
Quantas pessoas com total controle de suas faculdades mentais se dão ao luxo (ou à pobreza) de ter apenas o necessário e de esbanjar na gastança de viver mais e melhor?
Espera aí, eu é que devo estar ficando louca! Como alguém poderá viver mais e melhor com pouco dinheiro? Uma vez que viver mais e melhor, nesta era, significa ter uma enorme casa (ou várias), um enorme carro (ou vários), uma enorme conta bancária (ou várias). Então, eu devo crer que se vinte e quatro horas já não são suficientes para se conseguir tudo isto que (supostamente) é necessário para ser feliz, imagine se alguém está a fim de perder tempo com futilidades como ler, ouvir música, assistir filmes, plantar, ou simplesmente cuidar dos filhos.
Outro dia, conversando com uma destas pessoas que chamamos “a exceção”, ela confessou abismada que a primeira coisa que perguntam ao vê-la passeando calmamente pelas ruas é:
— Você não trabalha???
Sabe o que ela responde
— Trabalho o suficiente para poder ser feliz!
Claro que esta pessoa não mora em mansão, nem tem carrão, nem um contão no banco. A menos que fosse uma herdeira rica. Porém, para “a exceção” a felicidade dos pequenos prazeres lhe garante um vidão. Lê bons livros, vai à academia, assiste filmes, pinta, borda e tricota... Tricota, pinta e borda.
Você deve estar se perguntando:— Ela trabalha?!?!
Eu lhe respondo: — A “exceção” trabalha o suficiente para poder ser feliz, pois sabe que a felicidade não precisa de gaveta.

(Do meu livro Na Sala de Espera.)

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