Correria


 
UM alerta tem se dado sobre uma epidemia existente. De todas as síndromes possíveis do século, a falta de tempo tem sido o mal de toda gente.
Um exacerbado acúmulo de tarefas por fazer, de sonhos a executar, de sonhos a sonhar... Simplesmente porque não se tem mais tempo para gastar.
Alguém um dia sugeriu: “organize o seu tempo”. Assim tentei fazer, e uma das primeiras providências foi abandonar o relógio. Como se o velho amigo de pulso me impusesse, no compasso das horas, os poucos minutos que ainda sobravam para cada coisa. Não olhar os ponteiros infalíveis poderia amenizar a paranóia da correria controlada. Opção errada.
Do acordar ao dormir, mesmo que um cuco neurótico não grite a cada hora que o tempo está passando, o dia já não é suficiente para fazer tudo o que se precisa. Quem dirá o que se deseja. Então se corre – como o coelho da história da Alice – em qualquer país. Por todo planeta uma mensagem universal é facilmente assimilada: Estou com pressa!
As 24 horas do dia já não passam, voam. Se uma hora continua tendo 60 minutos e 1 minuto continua sendo composto de 60 segundos, por que o dia parece que está sendo sequestrado? Procuro quem deva estar por trás de tudo isto e imagino um mago inconsequente empurrando o globo terrestre para que ele gire como carrossel desgovernado. Sinto-me nauseada!
A globalização colocou o mundo em total conectividade. O que acontece na China, no Alasca ou na África, chega a nós em tempo real. Isso quer dizer que estamos interligados. O que acontece; o que muda; o que precisa ser mudado... Já não é assunto de comunidade.
As informações se atropelam, as inovações pedem reciclagem. Já não dá mais para viver num mundinho, é preciso acompanhar o mundão. O slogan diz: “perde quem fica para trás”. Então, precisamos correr! Está explicado: o vilão não é o tempo, o tempo é que foi violado.
O finado Sócrates nem sequer imaginou que séculos diante do seu o homem não teria tempo para viver, nem sequer filosofar.
Pensamentos ficam amputados; idéias são abortadas; planos esquecidos; desejos esmaecidos.
A vida sem sentido é disputada na maratona do dia e ele só tem 24 horas. Corre Jesus, Ave Maria! O filho que espere. O cachorro que se vire. Os amigos, outra hora. A poesia, mais tarde. Apaga a luz, amanhã é “outra-feira”,quem dera fosse domingo.

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