Simples assim


À medida que o mundo vai evoluindo, as invenções de todas as áreas já não são mais tão surpreendentes, e sim, esperadas. Lembra quando o primeiro celular virou realidade nas mãos dos usuários? Foi um tititi! Até então, o mais real que a nossa visão sobre o futuro dos avanços tecnológicos alcançava, era colhido no cotidiano da família Jetsons.
Ainda não chegamos à era das cidades suspensas, nem dos carros voadores. Sinto não viver a tempo de possuir uma robozinha graciosa vestida de avental e touca, supereficiente nos serviços domésticos. Mas a coisa anda tão avançada que não me espantaria caso inventassem o teletransporte. Tipo, “vou para casa da mamãe”, programo o GPS da mente e, em milésimos de segundos, estou na cozinha dela tomando café.
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Exagerada, eu? Pois saiba que todo e qualquer suposto exagero no que diz respeito à física quântica não é nenhum exagero.
Contudo, em meio a este burburinho evolutivo, venho percebendo que as coisas simples estão sendo, naturalmente, descartadas e guardadas na estante das coisas desinteressantes. Se não for digital, 3D, 3G (agora já é 4G), tá fora! E isto me preocupa.
Não estou querendo reativar o celular modelo tijolo, que foi do meu pai e que repousa surdo e mudo no armário das relíquias estimáveis da minha mãe.  Refiro-me à simplicidade do comportamento das pessoas que, misturadas aos avanços científicos, acabam complexando o próprio jeito de ser e de viver para se enquadrarem no contexto. Cria-se teoria científica para tudo, e para cada teoria criada compõe-se um título pomposo que, por sua vez, é subseguido de vários subtítulos mais espetaculosos ainda. Porque não há mais espaço para a singeleza numa sociedade super evoluída.
O chazinho caseiro, o unguento de basilicão, a compressa de água morna, o pé na areia, o banho de cachoeira, a experiência dos mais vividos, a conversa ao pé do ouvido, tudo isto está ficando prosaico demais. Tanto que, quando me dou conta, estou morrendo de saudade de experimentar a trivialidade e jogar para o alto a dieta esplendorosa.
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Dia desses, meu filho contou exultante que a professora havia lhe dado um elogio diante de toda a turma, dizendo que o seu comportamento estava exemplar. Na última vez que vi aquele brilho faiscante em seus olhos, ele acabara de ganhar um novo jogo de videogame. Então pensei: Poxa que bacana! O elogio da professora é tão emocionante quanto o último lançamento do Mortal Kombat. Meu lado mãe vigilante de filho estudante pode tirar um merecido descanso, uma vez que - aposto minha coleção de canecas – ele vai querer manter aquele elogio até o fim do ano letivo.
Simples assim, um elogio sincero, uma palavra mágica, um telefonema aguardado, um cafuné inesperado, um toque de mão desejado, um sorriso surpreendente, um presente fora de hora. Atitudes banais são capazes de despertar a autoestima, resgatar a autoconfiança, encaminhar uma carreira, auxiliar numa decisão, mudar o dia e a vida inteira de alguém e, o que é melhor, poupar anos de psicanálise. Coisas que não possuem nenhum componente de última geração, pelo contrário, são da geração dos avós, bisavós e tataravós dos personagens desta era digital , mas que sempre foram poderosos estimulantes do nosso sistema sensorial.
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Assistindo ao filme “Tron: O legado” com meu filho, o mesmo aficionado de videogame, não pude deixar de sentir uma nostalgia e um medo danado de que, num futuro muito próximo, as pessoas escolham existir virtualmente. Com imagem, som, inteligência de última geração. Sem falhas, sem chuviscos, sem distorções ou interferências, sem emoção. Antevi, durante o filme, o planeta sendo habitado por Smart Pessoas ou Smart Peoples, como acharem melhor, e me escondi debaixo do cobertor. Meu filho não entendeu nada, afinal, o filme é de ficção científica e não de terror. Atualíssimo para cabecinha dele, apavorante para cabeça de sua mãe.
Enfim, não sou louca de ordenar “meia volta volver”! Concordo em seguirmos adiante, rumo ao futuro fantástico que se escancara logo ali na nossa frente, mas sugiro que não abandonemos a simplicidade da sensibilidade, pois o que corre em nossas veias ainda não é fluído nuclear gelado, é sangue vermelho e quente. As emoções não necessitam de óculos especiais para serem vistas e sentidas. O elogio, o beijo, o abraço, o carinho, o amor, possuem o poder de ultrapassar as barreiras do espaço e tocar o corpo e a alma de quem vê, dá e recebe, assim, como sempre foi, a olho nu, numa Dimensão que ultrapassa anos-luz a de número 3.

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