O medo que mora comigo


 
ADMITO corajosamente que tremo, suo e tenho cólicas só em me imaginar numa aventura radical. Destas que ativam a adrenalina dos corajosos e o pânico dos medrosos. Tenho medo sim!
Claro que tentei mudar. Lógico que experimentei a terapia de choque para vencer o que (psicologicamente analisando) me atrapalharia pelo resto da vida.
O primeiro duelo que travei com o medo foi sobre as dunas. Nada de armas, nada de contar passos e atirar mais rápido. Apenas um buggy, alguns amigos, um motorista inexperiente, eu e o medo. Sobe dunas, desce dunas, acelera na descida, um pouco mais na subida...UHHHH!!! Cabelos voando, os amigos sorrindo, o medo gargalhando, uma freada brusca e eu... Estendida no chão! Com o nariz quebrado e o medo vitorioso zombando: “Quero ver explicar à sua mãe!”
Como as dunas são o playground de quem mora junto à praia, travei a segunda batalha com o medo novamente sobre elas. Alguns amigos, todos inexperientes, uma prancha de sandboard, eu e o medo. Desço primeiro sentada, por ser mais confortável (mentira). Depois em pé por não ser covarde (mentira). UHHHH!!! Cabelos voando, os amigos sorrindo, o medo gritando e eu...
Estendida no chão! Com um novo rosto esculpido de areia, o tornozelo inchado e o medo zoando no ouvido arenoso: “Quero ver explicar à sua mãe!”
Dei por encerrada a minha história de combate na areia. Na terceira vez que encarei o medo, foi sobre o mar. Alguns amigos, um ultraleve, um piloto experiente, eu e o pavor. Relutei. Tentei fugir. Dei a luta por vencida, preferi desistir. A torcida encorajou. Vai lá! É imperdível! Vai se arrepender se não for! Fui! UHHHH!!! Cabelos voando, a vida voando, o medo voando agarrado atrás de mim. E eu... Prestes a desmaiar nas alturas!Desci cambaleando, amparada pelo medo, e a cabeça eclodindo: “Quero a minha mãe!!!”
Desisti de lutar. Passamos da idade, eu e o meu medo de intrépidas experiências. Permiti que ele morasse comigo, o que de certa forma me torna corajosa.
Conviver com o medo me causou maiores problemas? Não sei. Só sei que se alguém, porventura, tentar me convencer a esquiar nos Alpes Suíços, descarto gentilmente a idéia dizendo que prefiro arriscar-me (heroicamente) sobre uma gôndola, em Veneza.

(Do meu livro Na sala de espera.)

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