De filha pra filhos



Corra até ele enquanto pode...

NÃO é a primeira vez que escrevo sobre  meu pai.
Sinto-me à vontade para escrever sobre ele sem medo de estar importunando você com uma historinha melosa e particularmente minha, porque ao falar do meu pai é como se estivesse falando sobre todos os pais de todos os filhos.
É a velha frase “só muda o endereço” entrando em cena mais uma vez para dizer que os pais, se não exatamente iguais, são completamente parecidos. E os filhos também.
É mais ou menos assim: a gente pensa que sabe o quanto ele é importante em nossas vidas, mas não se dá ao trabalho de dizer, pois tem certeza que ele já sabe.
Na verdade, só descobri a real importância do meu pai em minha vida quando ele deixou de fazer parte dela. Aí já não tinha mais como dizer a ele.
Herdei muitas coisas suas ao longo do tempo em que convivemos, embora ele não tenha feito nenhum testamento. Creio que sequer suspeitasse que tivesse algo valioso a me dar.
Certamente, se educação, respeito, honestidade, sinceridade, dignidade e humildade tivessem valor monetário, eu seria riquíssima! Pela quantidade disso tudo que ele deixou para mim.
Mas isto são coisas que a gente não percebe na hora. Como se ganhássemos presentes invisíveis e só conseguíssemos vê-los muito tempo depois. Valiosos presentes aos quais não damos o devido valor.
Preocupação de pai; conselho de pai; xingão de pai; rabugentice de pai; são ingredientes básicos que compõem o amor de um cara que precisa ser casca dura para ensinar você a lidar com a dureza da vida.
Não pense, por isso, que ele sabe o quanto é importante, nem considere desnecessário deixar claro que o ama com todas as letras que cabem no seu amor incondicional, pois pode acreditar, é assim que ele ama você.
Então, fale. E mesmo quando achar que já falou o suficiente: Fale!
Gastamos boa parte das nossas vidas tentando provar o quanto aquele senhor, que pensa que é nosso dono, é diferente de nós. Passamos tempo demais de nossas vidas contabilizando divergências, disputando opiniões, medindo forças. Tentando provar que somos donos do próprio nariz, mesmo que o tenhamos herdado geneticamente dele.
Consumimos tanta energia tentando provar a ele que não somos mais criancinhas, que perdemos o jeito de lhe fazer carinho. De lhe encher o rosto de bitocas. De lhe desmanchar todo cabelo escorregando a mão pelo seu rosto, terminando com uma apertada gravata no pescoço. Tudo para garantir a nossa posição de adultos no mundo. Doce ilusão.
Para todo pai que se preze filho nenhum cresce, portanto use e abuse desta condição. Corra até ele enquanto pode e lhe dê todo amor e carinho que andou esquecendo por estes anos afora, sem medo.
 Você não corre risco algum de parecer um adulto ridículo, afinal, para ele você não passa de uma criancinha sapeca brincando de ser gente grande.
(Esta crônica faz parte do meu livro Na Sala de Espera, que será lançado em breve.)

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