Perdida no País das Maravilhas


Vá para aquela sala, e aguarde. Ordenou-lhe a moça loira de olhos exageradamente pintados. Aquiesceu e pôs-se sozinha numa confortável poltrona. Numa das extremidades da ante-sala um belo jardim envidraçado guardava a luz que fugia da rua para dar vida às plantas ali existentes.
Percebeu, camuflada num canto do jardim de vidro, uma pequenina porta. Aquela passagem era um convite aos amantes da natureza. Resolveu aceitá-lo. Agachou-se como pôde, até estar inteirinha do outro lado certificando-se de que a bela orquídea amarela era mesmo verdadeira.  Quando tentou transpor o caminho de volta percebeu que não havia mais porta. Deu um giro e descobriu-se em um ambiente estranho, como um imenso bosque. Estava perdida.


- Não fique aí parada, você vai se atrasar! Mexa-se, mexa-se!

Vestindo um conjunto de jogging branco, seu personal trainer ordenava sem parar, correndo em volta dos arbustos. Correr para onde? O professor estava sugerindo que ela começasse uma maratona, logo no dia em que tirara para cuidar de si? Era só o que faltava! Tinha que encontrar a portinha de vidro.

- Corra, corra, senão você vai perder a festa.

Mas que festa? Não estava lembrada de ter sido convidada para festa nenhuma naquela tarde. Resolveu seguir o corredor maluco que havia enveredado para dentro da mata espessa. Deu de cara com uma mesa impecavelmente arrumada. Bules de prata fumegavam um delicioso cheiro de ervas, enquanto bandejas brilhantes exibiam tentadoras tortas, bolos e biscoitos. Que lugar era aquele? Queria sair logo dali.

- Não fique aí parada, está na hora do chá. Venha comer com a gente.

Seu chefe estava sentado à mesa usando uma cartola verde. E o que a sua mãe estava fazendo ao lado dele usando uma tiara com orelhas de coelho? Ou seriam de lebre?... Comer?! Como se não bastasse as vezes que ficavam criticando o seu cardápio light, estavam sugerindo agora que ela se atirasse sobre aquelas guloseimas deliciosas e ganhasse milhões de gramas a mais? Nunquinha! Que lugar esquisito! Precisava achar aquela porta antes que o chefe e mãe a convencessem e a engordassem.

- Fuma comigo, então... Fumar emagrece.

Deitada de bruços sobre um galho gigante, a vizinha zen do 301 soltava fumaça rosa tragada de um narguilé. NÃO! Há um mês havia parado de fumar. Não queria voltar, nem engordar, nem correr. Onde estava a maldita porta de vidro?!

Na procura desesperada acabou espetando o dedo. Parou para retirar o espinho, quando ouviu alguém rindo.  Por pouco não caiu inteirinha em cima do cacto.  Brad Pitt, o gato, estava na sua frente sorrindo-lhe de orelha a orelha. E que sorriso! Que olhos! Que pêlos! O marido que desculpasse, ela tinha que agarrá-lo. Marido? Quem mandou pensar nisso naquele momento? O gato desapareceu. BRAD QUERIDO VOLTE! Posso pedir o divórcio!

- Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça!

 A sogra surgiu gritando por entre as rosas vermelhas. Mas, ela não havia tocado num único pelinho dele... Nem sequer pôde senti-lo arrastando-se nas suas pernas. Sempre soube que aquela mulher era louca. Tinha que escapar! Onde estava saída?

- Está na sua hora! Está na sua hora!

A secretária indelicada lançava o par de olhos exagerados sobre ela enquanto sacudia-lhe pelo braço. - ACORDE!!!
O psicanalista sorria-lhe da porta.
Levantou-se sonolenta e parou esperançosa em frente ao jardim envidraçado. E se o Brad Pitt estivesse escondido atrás das samambaias?... A consulta seria longa

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