Sobre Amy

Quando chegou a mim a notícia da morte de Amy Winehouse, primeiramente fiquei chocada, depois reflexiva, por último triste. E, num momento pós-emoção, questionei-me se deveria escrever sobre o acontecido.
Preferiria ter escrito sobre Amy em vida. Isto me leva a pensar nesta mania boba que temos de endeusar os mortos, esquecendo-nos de coroar os vivos.
Depois que Amy foi para céu, ou para o inferno, (que é onde, creio, a maioria das pessoas pensa que ela está) fica mais fácil falar sobre ela, como se falássemos sobre um personagem que passou pelo planeta rapidamente deixando um rastro de escândalo e glória. Como se estivéssemos diante da estátua de uma deusa, para alguns ou de uma bruxa, para outros; despejando nela todas as impressões que nos deixou ou causou, sem receio de sermos julgados e punidos.
O que poderia falar sobre Amy alguém que nunca a viu e sequer teve conhecimento real sobre sua vida? Sobre sua família; sua infância e adolescência; suas alegrias, medos, traumas. Sobre seus amores e suas dores... Afinal, assim como cada um de nós, ela é o resultado de todos estes fatores. E só poderia expor uma opinião sobre a pessoa Amy, quem conheceu cada um deles. Não eu.
Só posso falar sobre a cantora, da qual desenvolvi uma enorme admiração pela voz inconfundível e marcante que lembrava o timbre das divas negras do soul. Pelas canções que chegavam até mim e caiam imediatamente na caixinha das coisas que me agradam muito e que me emocionam demais.
Adorava Amy sem levar em conta os seus deslizes, seus escândalos, suas aberrações. E, me pergunto hoje, por que o rebolado das bundas vulgares de certas celebridades; o teatro ensaiado dos falsos artistas; a arrogância dos jogadores milionários de futebol; chocam e irritam-me mais do que a louca carreira da diva branca do soul. E posso responder.
Amy Winehouse, independentemente de todas as besteiras que tenha feito na vida, foi uma artista de verdade, ou melhor, como pouquíssimos que já passaram por este planeta.
Não foi exemplo de nada, dizem alguns; e respeito esta forma de pensar. Certamente as atitudes da cantora não são coisas a serem copiadas, pelo contrário, me pareciam pedidos urgentes de socorro de alguém que precisa ser salvo e não sabia nem de quê. Ninguém conseguiu salvar Amy. Talvez ela não devesse ser salva. Talvez ela tivesse que passar exatamente da forma que passou, rápida e
inesquecivelmente.
Aprendi a gostar de Amy Winehouse, por livre e espontânea paixão. Sobre sua vida desregrada só posso lamentar, pois a queria viva por muito tempo ainda, para me encantar com suas canções. Num egoísmo de quem é fã fiquei indignada com o seu desaparecimento precoce e, consequentemente, com a sua falta de cuidado com os monstros invisíveis do mundo. Gostaria de tê-la visto sair ilesa, com sua voz e inspiração intactas, com seu corpo limpo e sua mente sã, mas não foi assim. O universo tem seus caminhos e motivos e quem sou eu para questioná-los ou explicá-los?
Não julgarei, pois a mim não cabe um papel que o próprio Cristo dispensou. Cabe-me unicamente reconhecer o seu raro talento e lembrar que a beleza às vezes surge no meio do caos e, mesmo assim, jamais deixará de ser bela. Porém, para vê-la é preciso olhar com o coração.
No meio do pântano Amy Winehouse se fez bela para sempre, através da música. É isto o que eu vejo e o meu coração sente.




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